quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A Mãe

Foi a primeira pessoa a chegar à sala onde ia haver a reunião de conselho de turma. Sentia uma certa curiosidade em conhecer os professores da filha. Como seriam, o que diriam, que modo de encarar a vida deixariam entrever… É que a filha pouco falava em casa e os tempos de escola dela já iam bem longe.

Quando já estavam todos os professores reunidos na sala, o director de turma apresentou-a ao conselho: D. Ana, a mãe de Marisa. Todos lhe dirigiram um sorriso. Porém, no momento, pouco acrescentaram para além de um Olá, como está.

Iam pensando como mãe e filha eram tão diferentes. Marisa sempre extravagante e imprevisível. Chegava a ser provocadora pelos adereços que usava ou pelo modo como reagia face a propostas de trabalho que lhe desagradavam.

A mãe vestia um casaco grosso e antigo de fazenda. Parecia já ser agasalho há muitos frios Invernos. O cabelo grisalho acentuava a pele branca. À primeira vista, parecia avó de Marisa. Mas, ao longo do quase monólogo, parecia uma menina a quem davam a prenda de poder falar e ser escutada.

O tempo era reservado ao diálogo com os representantes dos encarregados de educação. E ela falava. Sem pressa e sem direção definida. Como se tudo fosse natural mas urgente. Pedia aos professores (não sabia bem se era pedido ou sugestão ou lembrança contra o esquecimento…) para serem compreensivos com os alunos, para os estimularem nos diferentes momentos, para serem tolerantes na data de entrega de trabalhos, para lhes darem uma palavrinha quando vissem que tal era necessário…

E entrelaçava estes desejos com problemas que conhecia muito bem, porque se confrontava com eles todos os dias e a todas as horas dentro de casa: solidão, depressão, dificuldades de toda a ordem...

Os professores quase não a interrompiam, sobretudo porque ela punha as questões e logo dava respostas. Como se estivesse habituada a falar só para si própria, a argumentar e a contra-argumentar sem interlocutor.

Tão diferente de Marisa que não ia além do superficial. Marisa, quando falava, parecia crivar as palavras, eliminando as mais gastas, pesadas ou inúteis no momento. A mãe, pelo contrário, embalava-se no seu próprio discurso. Parecia uma fonte cansada ainda que tranquila. E também distante, quase nunca procurada, ainda que necessária. Uma fonte na qual quase ninguém reparava, a menos que secasse.

Chegada a casa, contaria a todos a reunião.

Talvez conseguisse, porque se sentia bem mais aliviada.

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