domingo, 5 de fevereiro de 2012

A menina da caixa


Já estava na caixa registadora desde o Natal. Logo nos primeiros dias de trabalho, teve de usar um barrete de pai-natal. Embora tivesse há uns anos deixado de acreditar naquela figurinha gorda e de barbas brancas. E sentia pena das renas que tinham de correr muito e pouco ganhavam com isso. E muitas vezes ninguém olhava para elas, porque quem tinha as prendas era o pai-natal.

Nunca mais esqueceria o calor que sentia na cabeça enquanto registava as contas do bacalhau, do açúcar, da aletria, dos chocolates, dos brinquedos… Enquanto ouvia: ó mãe, quero um ovo, eu quero, mas eu quero… Pronto, pega lá o ovo e está calado!

Só esperava era não ter de usar umas orelhas de burro no Carnaval, porque até era boa aluna. Tinha era de contribuir para as despesas dos estudos e da casa e por isso tinha um part-time. E tinha sorte porque muitos amigos queriam e não arranjavam.

Em cada dia de trabalho, repetia a saudação inicial mais de quarenta vezes. Assim como perguntava se o cliente tinha cartão para os descontos. Metia as compras nos sacos, seguindo as instruções que tinha. Algumas clientes queriam menos coisas em cada saco. Ó menina, não ponha aí os tomates, não vê que pisa. Outras deviam ser mais ecológicas e queriam mais coisas juntas para poupar os sacos. Outras pediam: ó menina, posso levar alguns saquinhos?

Era chato era a dificuldade em reconhecer alguns frescos. Sempre tinha confundido a couve-flor com os brócolos. E as variedades de maçãs também demoraram a aprender.

Enquanto a máquina faz os cálculos, as mãos sempre sem parar: abrindo os sacos para poupar tempo depois. Quase sem olhar à sua volta. O pescoço já dói um pouco. E os braços também. O vinho em promoção é pousado às caixas no tapetinho rolante e tem de pegar nelas para registar e passar ao cliente.
Tudo tem de ser feito com simpatia e atenção às contas. No final do turno, tudo tem de bater certo.

Quando chega a casa, às vezes nem diz boa-noite. A mãe não fica nada contente mas nem sempre pergunta porquê.

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